O dia começou cedo. Eram 6:30h da manhã do sábado quando o
nosso microônibus tomou o rumo de São José do Belmonte, distante cerca de 330Km
de Petrolina. Depois de quatro horas e meia de uma viagem tranquila, porém com
paradas emergenciais para administrar os problemas do motorista decorrentes da
pizza consumida na véspera, chegamos ao destino por volta das 11:00h,
praticamente na fronteira de Pernambuco com a Paraíba, e rodeados de uma
paisagem verde e um clima ameno, bastante diferentes de Petrolina e região. Nos
instalamos na Pousada Alto do Guerra, onde fomos muitíssimo bem recebidos e
acomodados por D. Olimpia e família.
Antes do almoço na Tapiocaria, no centro da cidade de 30.000
habitantes, aproveitamos para fotografar a feira que acontecia na praça vizinha
e também o final de uma demonstração de ruidosos bacamarteiros na praça
principal, em frente à igreja. Com tiros e explosões de grande impacto, eles
foram a sensação das nossas máquinas fotográficas pré-almoço.
Depois de abastecidos, foi fomos conhecer o Reino Encantado,
uma mistura de mausoléu/museu/castelo de fadas/construção medieval, inacabado e
absolutamente incrível, onde se pode apreciar registros de todos os tipos
(livros, esculturas, quadros, objetos etc) sobre a vida do sertanejo e o
folclore da festa que acontece sempre no último final semana de maio.
Foi lá que estavam sendo maquiadas as damas que em seguida
iriam participar da Cavalhada, realizada no estádio de futebol, ao lado do
Reino Encantado. Na Cavalhada propriamente dita, duas equipes de cavaleiros -
Azul e Encarnado - reproduzem jogos típicos da Idade Média, procurando acertar
argolas penduradas com suas lanças durante a corrida, entre outros. Tudo isso
ornamentado por rei, rainha, damas de honra, locução oficial, banda de pífanos
e uma platéia que se dividia na torcida pelas duas equipes. De noite fomos
dormir cedo, pois o dia seguinte seria o mais puxado de todos.
De fato, o domingo começou às 4:00h, quando começamos a nos
arrumar para ir até a Tapiocaria onde o café da manhã foi servido ainda no
escuro, às 5:00h. O sol ainda nã tinha aparecido quando so fogos foram
acionados e os primeiros cavaleiros começaram a surgir na prça. Logo depois
veio o padre, os cantadores e o aboiador. Com a música instalada e o dia
nascendo, o público foi aparecendo até que uma grande multidão presenciou a
benção do padre aos cavaleiros, que então partiram na famosa Cavalgada à Pedra
do Reino, um percurso de cerca de 28Km pelo meio mato.
Na base do improviso, conseguimos acomodar a maioria dos
nossos jornadeiros na caçamba das pick-ups que iriam acompanhar o cortejo. Até
o carro do Corpo de Bombeiros foi usado, e levou cinco dos nossos entre
equipamentos de primeiros socorros. O que se seguiu para esses jornadeiros foi
uma grande aventura, com duração de mais de cinco horas, muita terra, muita
poeira, muito solavanco e, com certeza, ótimas imagens. Para contar essa
história, no entanto, vou precisar do depoimento de quem estava lá. Espero em
breve poder preencher essa lacuna na presente narrativa.
Os poucos que não conseguiram embarcar foram diretamente
para a Pedra do Reino, num percurso relativamente longo através de estrada de
asfalto e estrada de terra. Uma vez lá aguardamos a chegada da tropa, o que
iria acontecer apenas por volta do meio-dia.
Nesse meio tempo fomos brindados com a abordagem do Sr.
Ernando Carvalho, profundo conhecedor do episódio histórico acontecido no
local, e que nos presenteou com uma longa aula, rica em detalhes, sobre o
assunto. Vou procurar fazer um resumo dessa tenebrosa história em outra
postagem.
Cobertos de poeira e terra, queimados de sol, absolutamente
esgotados e imensamente satisfeitos, retornamos para o almoço na Tapiocaria e
depois para a pousada, tomamos banho e partimos para Petrolina às 16:30h, onde
desembarcamos às 21:00h.
Na bagagem, trouxemos um pouco do percurso que se inicia em
1836, com um grande massacre de vidas humanas, prossegue com uma ficção
inspirada nesse episódio ("O Romance d'A Pedra do Reino", de Ariano Suassuna) e
termina com uma celebração anual que reproduz cenas do romance desse grande
escritor. Da vida à arte à vida, fica a lição de que as interações são mútuas,
complexas e, geralmente, surpreendentes. Parabéns à Associação Pedra do Reino
pela belíssima festa, assim como para a acolhedora São José do Belmonte e seus
habitantes.